Antes de tudo é preciso que eu localize o princípio desse meu texto. Estou trabalhando ao lado de figuras ilustres da nossa arte brasileira, como Tarsila, Pancetti, Di Cavalcante, Hélio Oiticica, entre outros, no Museu de Arte do Rio, e convivo com a opinião do "público" sobre eles.
A popularidade, como sabemos, exibe muitas facetas e nem todas elas são saudáveis. Com a popularidade, por exemplo, no que se destina a arte, vem o senso comum, as doutrinas e os discursos da industria cultural e a proximidade de uma massificação da própria arte, como bem dizia Walter Benjamim: "o fim da aura". Portanto é de suma importância relativizar e criticar os "avanços" que os mecanismos impõem, de qualquer tipo de arte, sobre o povo. Devemos muito dessa popularização à educação, ou melhor, ao didatismo da arte nas escolas, o que é um grande passo para construção de um povo forte e consciente, porém com seus problemas, devido às brevidades das abordagens.
A popularidade, como sabemos, exibe muitas facetas e nem todas elas são saudáveis. Com a popularidade, por exemplo, no que se destina a arte, vem o senso comum, as doutrinas e os discursos da industria cultural e a proximidade de uma massificação da própria arte, como bem dizia Walter Benjamim: "o fim da aura". Portanto é de suma importância relativizar e criticar os "avanços" que os mecanismos impõem, de qualquer tipo de arte, sobre o povo. Devemos muito dessa popularização à educação, ou melhor, ao didatismo da arte nas escolas, o que é um grande passo para construção de um povo forte e consciente, porém com seus problemas, devido às brevidades das abordagens.
É bom ver que todo mundo, ou quase todo mundo, reconhece
Tarsila do Amaral de longe, sem pestanejar, sem muitas dúvidas (às vezes escorregando
em Djaniras e Malfattis), mas realmente são icônicas, emblemáticas, e identitárias
a ponto de serem referenciadas pelos brasileiros comuns, as representações
dessa artista.
“Uma identidade!” é o que dizem todos que avistam os quadros
da “senhora antropofagia”, “Não tem como não saber, é a cara dela!”. De fato os
quadros dessa etapa tem algo em comum e é mais ou menos um pouco de tudo o que
nós conseguimos decifrar: formas arredondadas, despreocupação formal, o uso de
cores primárias e vivas, temática que envolve a identidade nacional, a desproporção
acentuada, entre outras coisas que se pode enumerar. Mas está em enumerar, que
advém da ideia de que temos que nos posicionar como críticos maniqueístas, sabedores
do que é bom e ruim, o erro da questão.
De algumas décadas para cá as escolas começaram a trabalhar
muito a ideia de o modernismo ser um período artístico no Brasil de “ruptura” com
a simples reprodução dos conceitos artísticos estrangeiros, para ser a “reprodução
digerida” e seletiva do que é bom, sem esquecer a nossa identidade, identidade
esta que se pautaria exatamente nesse digerir, como o canibalismo (antropofagia)
de algumas tribos de nossos “povos originários”, os indígenas, sugere; reforçando,
assim, um símbolo de brasilidade, já preexistente nas formulações ideológicas
do movimento, introduzindo alunos e professores brevemente nessa história tão
cheia de pormenores e contextos. Outras formas de propaganda de fixação foram
também parte responsável, na criação desse discurso opinativo e de gosto que se
formou, especificamente, pelos quadros de Tarsila, como o uso de suas pinturas
em contracapas de cartilhas escolares e etc.
A reboque dessa identificação, desse reconhecimento, tanto
de crianças, como de jovens e adultos, está, contudo, aquilo que a escola consegue
fazer melhor hoje em dia: criar e fortalecer o senso comum. Melhor dizendo,
ainda que se tenha o reconhecimento que se merece, a arte da Tarsila é vista de
maneira técnica pelas pessoas que a reconhecem e o primeiro sintoma dessa
tecnicidade é a opinião.
Quando me refiro a “maneira técnica” quero exemplificar um
olhar que Heidegger enunciou como um sinal dos nossos tempos modernos, um olhar
que pretende prever o que se pode ganhar em tudo o que há no mundo, o que serve
e o que não serve, inclusive na arte. De modo que essa maneira técnica de ver a
arte só percebe o que a arte não é: alvo. Sendo assim é um olhar breve e
nebuloso que se experimenta.
A opinião negativa
Talvez essa seja o sintoma mais perceptível, pelo menos no
que tange ao senso comum tecnicista. Torcer o nariz, dizer que não gosta do “estilo”
dessa pintora, achar que ela não sabia pintar, que qualquer um pode fazer
igual, ou mesmo que a Tarsila pintava como uma criança..., exemplificam a forma
brutal de suspender o contato com a arte exibida e se sustentar na sua própria
ignorância. Todos podemos dizer que gostamos e que não gostamos de qualquer
coisa, mas daí a dizer que tal pessoa não sabia pintar é ignorar a história
dessa pessoa, e desconhecer cegamente aquela artista enquanto tal. Dizer que é fácil
fazer é desconhecer o oficio de pintar. Na prática nunca é fácil. Dizer que ela
pintava como uma criança é desconhecer totalmente o movimento e as ideias envolvidas.
De toda a forma é ignorar a artista. Mas a arte é a que mais escapa nesses
quesitos estáticos, pois o contato já ficou diluído por preocupações técnicas
que nem sequer se sustentam na critica ao artista (algo menor, na minha singela
opinião, do que a arte).
André Vargas